17:43

GENTILEZA (MARISA MONTE)


Gentileza,figura notória no Rio de Janeiro, ensinava que pequenos atos gentis tornam a vida mais agradável. Sua loucura não estava no que fazia, mais no que acreditava. Quem dera todos fossemos loucos também...

Apagaram tudo
Pintaram tudo de cinza
A palavra no muro
Ficou coberta de tinta
Apagaram tudo
Pintaram tudo de cinza
Só ficou no muro
Tristeza e tinta fresca
Nós que passamos apressados
Pelas ruas da cidade
Merecemos ler as letras
E as palavras de Gentileza
Por isso eu pergunto
À você no mundo
Se é mais inteligente
O livro ou a sabedoria
O mundo é uma escola
A vida é o circo
Amor palavra que liberta
Já dizia o Profeta

16:26

“O REI ESTÁ NU!”

Meu artigo publicado no Jornal de Hoje

Com esta pequena frase uma criança expôs o embuste de dois falsos costureiros, a vaidade exacerbada de um rei e a conivência medíocre de centenas de súditos.
Quisera Deus que pudéssemos permanecer, enquanto adultos, com a mesma impetuosidade recheada de sinceridade em nossas expressões verbais. Nesse caso, o que era pra ser dito não seria escondido atrás de uma falsa idéia de convivência pacífica.
Talvez seja isso o que esteja faltando em nós educadores, a expressividade verbal simplória mais profunda da natureza infantil. Se permanecêssemos com esta, não nos envergonharíamos em expressar todo nosso pensar aos nossos “reis-gestores”.
A pouco, doze turmas da escola em que trabalho foram dispensadas mais cedo a fim de que os educadores pudessem reunir-se para uma reunião pedagógica. Após passada uma hora ocupada com uma dinâmica e lanche, todos foram dispensados sem ao menos encontrar o “P” do pedagógico que, deve ter se perdido no sacode do forró que “rolava” por lá. Quem não se perdeu mesmo foi o “A” afinal de contas aquela era a festa do amor recebendo essa honrosa nomenclatura de quem a idealizou. Todos comeram, beberam, se abraçaram e foram embora felizes e sorridentes. Baco teria adorado tal festa. Deve ter se revolvido em seu túmulo querendo estar presente a esta com a mesma intensidade que me fazia querer sair de lá. E talvez essa confraternização tivesse sido realmente boa se realizada em uma ocasião propícia. A educação no Rio Grande do Norte está às avessas e nossos reis-gestores dispensam cerca de 450 alunos em um dia contado como letivo para ofertar à sua classe docente uma festa do amor. Basta desta politicagem imunda!
Este artigo é uma maneira de expor a nudez de nossos reis-gestores, de expor a conivência de outros educadores que ao ver as partes pudentas dos mesmos expostas vergonhosamente, continuam como os súditos da história infantil “A Nova Roupa do Rei,” de Hans Christian Andersen, ou seja, enquanto o rei desfila nu estes exclamam: Oh, que bela a roupa do rei! pois não querem parecer diferentes dos demais à sua volta, ignorantes que não vêem o que de bom está sendo feitos à estes.
Já dizia Louis Paswels: “Quando a criança escuta história que se lhe conta, penetra nela simplesmente como história. Mas existe uma orelha atrás da orelha que conserva a significação do conto e o revela muito mais tarde”.
Para mim, a história “A nova roupa do rei” teve uma revelação, não divina, porém importante quanto a como devemos agir a fim de não deixar nua a educação norte-riograndense, pois como diria Nélson Rodrigues “Toda nudez será castigada”.

12:08

COMO SE CONQUISTA UM ELEITOR

Um desabafo de quem acredita e luta por uma educação de qualidade

Peço uma licença poética a saudosa (e mais brasileira do que muitos de nós), Clarice Lispector para iniciar esse artigo com suas palavras publicadas no Jornal do Brasil em 22 de junho de 1968. Dizia ela: “Não sei mais escrever, porém, o fato literário tornou-se aos poucos tão desimportante para mim que não saber escrever talvez seja exatamente o que me salvará da literatura. O que é que se tornou importante para mim? No entanto, o que quer que seja, é através de literatura que poderá talvez se manifestar”.
Deveras posso não saber escrever, mas posso sentir e é esse sentir que guia meus dedos não mais nas linhas frias de um caderno (como fazia enquanto criança) ou nos toques sofridos de uma charmosa máquina de escrever, mas guia-os nas teclas gélidas dessa maldita e tão necessária máquina chamada computador.
Hoje vi uma cena paradoxalmente comovente e amoral.
A entrega do material escolar para as crianças matriculadas no município de Natal foi “o” evento do ano. Nunca se viu tanta generosidade: um kit recheado com o que aquelas crianças nunca sonhariam em comprar, pois muitas delas não tem sequer meros trinta centavos para comprar um lápis! Há muitas que não tem nem o que comer!
Ver seus olhos brilhantes diante de tanta abastança: cinco lápis, seis canetas, seis borrachas, caderno, réguas diversas, fichário, colas, tintas, massinhas entre tantas outras coisas foi deveras comovente acredito que nem papai Noel vestido de verde e amarelo, cantando “Aquarela do Brasil”, por ser fã número 1 de Ary Barroso, teria sido tão generoso!
O que me deixou enojada foi ver os responsáveis por essas crianças darem glória à Deus no céu e a nossa “esforçada” prefeita pelo regalo ofertado. Rendidos e vendidos por esse assistencialismo barato, ilusório e imediatista. Estavam todos já falando em reeleição sem ao menos se importar de que seus filhos não sabem ler.
De que lhe serve um caderno novo se este será usado tão somente para copiar as tarefas redigidas nas aulas de cuspe e giz que os educadores darão? Tarefas que não fazem nenhum sentido para seu viver, que não lhes permitirão alcançar a tão sonhada consciência crítica de cidadão (baboseiras discursadas pelos educadores e que juram ser o objetivo principal da escola).
De que lhe serve um fichário sem folhas e que permanecerá dessa maneira aja visto a carência de recursos financeiros da grande maioria?
O que farão com tantos lápis e canetas se estes não podem arrancar as folhas dessa vida marcada pela exclusão social e escrever uma história nova para si e sua família?
Pois esses mesmos pais elegem a escola, com resultados totalmente improdutivos, pelo segundo ano consecutivo como a melhor escola do bairro. Não quero por meus pés nas demais. Nunca! Penso que meu viver compromissado com a educação seria sofrível.
Educação? Quem está pensando nisso? Não posso ser injusta, os pais pensam sim na educação de seus filhos, porém, a veem como fonte de renda (pouca é verdade) mais continua. Os políticos, por sua vez, a veem como um investimento no eleitorado miserável, pois sabem bem o que diz a sabedoria popular: “quem a boca do meu filho beija, a minha adoça”.
Eu, ilhada nessas palavras que estou a redigir, ainda vejo a educação como sinônimo de liberdade. E essa liberdade brindo com as palavras de Paulo Freire: “Ai daqueles que pararem com sua capacidade de sonhar, de invejar sua coragem de anunciar e denunciar. Ai daqueles que, em lugar de visitar de vez em quando o amanhã pelo profundo engajamento com o hoje, com o aqui e o agora, se atrelarem a um passado de exploração e de rotina”.
Cyntia Menezes

11:51

Um e-mail sobre choro, pão e circo

As palavras que seguem abaixo foram publicadas na coluna Cultura do Jornal de Hoje do dia 24/06/09.

 Em época de recesso escolar dou-me ao luxo de fazer uma programação “maneiríssima” com minhas sobrinhas. Além do teatro no domingo, combinamos um cineminha hoje. O filme? Hannah Montana, obviamente. Com certeza eu não era a figura mais empolgada em assisti-lo (elas nem repararam nisso tamanha a alegria). Então, ao ler o jornal pela manhã me surpreendi com a revelação de que deixastes uma lágrima escorrer (ou quase) ao final do filme. Por isso me questionei: haverá meu Deus algo que me faça realmente chorar em história para pré-adolescentes e adolescentes tendo adolescentes como protagonistas?
Mais uma vez lhe digo que não sou insensível. Não mesmo! Choro com facilidade assim como sorrio com facilidade (nada haver com distúrbio bipolar, viu?). Se quiser mesmo saber, chorei com “O Campeão” e acho que ainda hoje choraria se visse mais uma, duas ou três vezes. Assim como chorei com tantos outros filmes tão ou mais emotivos do que esse como, por exemplo, “Só resta a esperança” e me emociono quase sempre com “Cold Case”. Mas, a verdade é que não chorei com Hannah Montana – O Filme. Sei lá, acho que Freud explica tanto a minha ausência de choro quanto o seu derramar (e não debulhar) de lágrimas...
Deixando Freud quietinho em seu santo lugar de descanso, quer saber o que me faz chorar de verdade? O que nos é ofertado em sentido cultural aqui no RN.
Ora, se havemos de aceitar essa política de “pão e circo” que seja pelo menos por atrações que valham à pena. Enquanto o governo do meu querido e amado (salve! Salve!), Rio de Janeiro cala a boca da população com figuras como Elton John, Dione Warwick, Rolling Stones (tudo bem que eu só iria ao show deles por pura curtição) aqui o que temos? Excesso de bandas de forró com nomes pra lá de sugestivos e uma qualidade musical (eu disse mesmo qualidade?) altamente questionável. Mas, enfim essa é a arena que o povo quer entrar.
Não sou miserável ou sovina. Mesmo que tivesse que pagar por exposições ou shows que particularmente me interessam haveria de fazê-lo como quando tive o imenso prazer de ver Monet no RJ ou assisti Luis Miguel. Enquanto isso o que ou quem vem para cá? Nada!Ninguém! Fazer o quê senão chorar? Porém meu choro é muito menos carregado de significado do que o seu e isso quem diz não sou eu, e sim meu querido José de Alencar que escreveu as palavras abaixo que lhe oferto dada sua emoção com Hannah Montana – O Filme.
“Quando um homem chora, minha prima, a dor adquire um quer que seja de suave, ma voluptuosidade inexprimível; sofre-se, mas sente-se quase uma consolação em sofrer. Vós , mulheres, que chorais a todo o momento, e cujas lágrimas são apenas um sinal de vossa fraqueza, não conheceis esse sublime requinte da alma que sente um alívio em deixar-se vencer pela dor; não compreendeis como é triste uma lágrima nos olhos de um homem”.

18:40

VIDA DE EDUCADOR

Um mimo de Madalena Freire que eu gostaria de ter escrito...


Educador
Educa a dor da falta
a dor cognitiva
Educando a busca do conhecimento.

Educador
Educa a dor do limite
a dor afetiva
Educando a busca o desejo.

Educador
Educa a dor da frustração
a dor da perda
Educando o humano, na capacidade de amar.

Educador
Educa a dor do diferenciar-se
a dor da individualização
Educando a autonomia.

Educador
Educa a dor da imprevisão
a dor do incontrolável
Educando o entusiasmo da criação.

17:24

CULTO A ANORMALIDADE

Estando em uma fase condoreirista redigí as palavras que seguem...


Nosso maravilhoso poeta José Paulo Paes escreveu um poema intitulado “Ficção Científica”. Usando o atrativo jogo de rimas nos versos que o compõe ele fala sobre um planeta onde tudo era ao contrário: o seu ouro era de graça, o lixo custava caro, o muito era nada e o tudo muito pouco.
Às vezes me vejo dentro deste planeta meio ao contrário, chamado educação pública, e juro que me sinto muito mais perdida dentro dele do que o próprio astronauta do poema citado a pouco que aterrissou nesse planeta meio às avessas. Analise a situação que segue e veja se o mesmo não aconteceria com você.
Pais que tem filhos matriculados em escolas da rede privada de ensino sentem total segurança em deixar seus filhos nas mesmas, sabendo que o expediente dos educadores contratados pela instituição de ensino será o habitual. Em nenhum momento estes se darão ao trabalho de perguntar se o horário da aula será normal porque fazer tal questionamento seria ilógico. Porém a situação muda completamente de figura quando se fala de educação pública.
“É normal?”.
Esta é a pergunta mais comum feita nas escolas municipais do nosso estado cada vez que uma criança é levada à escola. Quem nunca a ouviu ou é surdo ou estava distraído por demais no momento em que esta foi feita.
Tantas são as vezes que os educadores a ouvem, que estes passaram até fazer piadinha em torno da mesma. Cada vez que um pai, uma mãe ou qualquer outro responsável pergunta se a aula é normal estes, em alusão ao parto normal, respondem de modo inaudível:
“Não, é cesariana”.
Hilário não? Não! Hilário é o fato dos educadores se indignarem com esta pergunta, a final de contas esse é o legado que eles próprios deixaram para nossas escolas. Falta-lhes uma atitude empática. Se estes mesmos educadores parassem para analisar tanto as suas ações quanto a dos seus colegas entenderiam que este questionamento é o mínimo que os pais podem fazer.
O culto à anormalidade nas escolas públicas de nosso Estado tem como principais protagonistas a sua classe docente. São eles que fazem com que o normal se torne anormal e vice-versa. Pare um pouco e analise com cuidado os questionamentos que seguem:
É normal um educador sair de sala de aula para ver parto de sua cadelinha poodle que lhe é tão querida como a um filho?
É normal um educador pedir um mês de licença para cuidar de um filho que não está doente?
É normal marcar consultas seguidas para ir ao dentista no horário de seu expediente?
É normal um educador se ausentar todas as sextas-feiras de sala de aula e ainda assim assinar o ponto e ganhar por este dia?
É normal um educador retirar-se de sala de aula para assistir um programa de tv qualquer ou simplesmente botar a conversa em dia com seu colega, enquanto seus alunos ficam sós em sala de aula ocupados em copiar uma gama de atividades registradas no quadro negro a fim de ocupar o tempo?
É normal um educador sentir-se perdido antes de terminar o primeiro semestre e lavar suas mãos como Pôncio Pilatos, ausentando-se de sua responsabilidade em favor de seus alunos?
Se a sua resposta a qualquer uma dessas perguntas for afirmativa, parabéns, você acaba de ganhar uma passagem só de ida para esse planeta meio ao contrário. Você a merece uma vez que considera o muito como nada.
A renomada autora de nossa literatura infanto-juvenil, Ruth Rocha deixou registrada em uma de suas obras, palavras importantes que nós os adultos não devemos desperceber:
“As coisas que a gente fala saem da boca da gente e vão voando, voando, correndo sempre pra frente. Entrando pelos ouvidos de quem estiver presente. Quando a pessoa presente é pessoa distraída não presta muita atenção. Então as palavras entram e saem pelo outro lado sem fazer complicação. Mas às vezes as palavras vão entrando nas cabeças, vão dando voltas e voltas, fazendo reviravoltas e vão dando piruetas”.
A educação é um bem que a todos pertence, logo, o que for dito a seu respeito não pode e nem deve ser desconsiderado por você, como se tudo o que fosse exposto entrasse por um ouvido e saísse pelo outro.
O que tem acontecido na educação norte-riograndense é um assustador culto à anormalidade. Sua força é tamanha que parece que estamos sendo conduzidos a mais um “Jonestown”. Não podemos fazer parte disso. Não podemos permitir o suicídio coletivo de mentes ansiosas por aprender.
Aceitar tal situação é receber um atestado de insanidade; e só a título de informação, não há mais vagas disponíveis no João Machado.

Cyntia Menezes

19:13

O PODER DE FOGO DA EDUCAÇÃO

Palavras de Gabriel Chalita são sempre bem vindas...


Algumas palavras têm o poder de trazer consigo uma imensa carga de sentimentos, emoções, expectativas, sonhos, desejos e quereres. São, a um só tempo, misto de poesia, de filosofia, de arte... Expressá-las e professá-las pode significar a mudança, a transformação, a transcendência. A junção de suas sílabas tem uma força capaz de mudar o mundo e, em casos extremos, funciona como um artifício bélico do bem, utilizado pelos desbravadores de novos tempos e pelos descobridores de novos caminhos. São armas que injetam ânimo, coragem, sensibilidade, talento. Dessa forma, podemos definir o amplo leque de sentidos e potencialidades da palavra educação, cuja beleza está em desvendar novos amanhãs e promissores horizontes. A todos nós, educadores, foi concedida a oportunidade de contribuir para promovê-la, transmitindo e propagando o desejo pelo conhecimento. Colaboramos para a criação de realidades mais belas e mais condizentes com os nossos sonhos. Faz parte da natureza humana querer sempre o melhor. Buscar a evolução, o desafio, a superação de limites. Façanhas impossíveis sem a educação como fundamento e passaporte. Ciente da grandiosidade dessa missão e de tudo o que ela pode proporcionar, o governo do Estado de São Paulo, por meio da Secretaria de Estado da Educação, tem trabalhado para fazer da rede estadual de ensino uma ponte capaz de levar nossos 6 milhões de alunos à aquisição de saberes, de competências e de habilidades capazes de torná-los cidadãos críticos e conscientes, aptos à construção de um futuro erguido sobre os pilares da infinita capacidade humana (que deve ser desenvolvida, incentivada e constantemente aguçada). Nossos programas, projetos e ações têm o objetivo primeiro de despertar mentes e corações para o prazer do aprendizado, da revelação, da epifania que caracterizam o fascinante processo da descoberta. Está sob nossa responsabilidade formar atores sociais talentosos, com maturidade intelectual e emocional suficiente para alcançar não apenas o sucesso profissional, mas a felicidade plena, em todos os aspectos de suas vidas. Todos os nossos alunos compõem um complexo contingente educacional, mas, ao mesmo tempo em que formam um grupo, uma coletividade, são também seres únicos, dotados de histórias de vida singulares, ricas e de natureza incomparável. São meninos e meninas, crianças e jovens provenientes das mais diversas realidades e origens. Muitos vivenciam uma infância e uma adolescência repleta de amor, de cuidado, de atenção e de incentivo de suas famílias. Outros, no entanto, sobrevivem a duras penas numa atmosfera densa, pesada, em nada parecida com o que deveria ser o aconchego e a proteção de um lar estruturado. São desprovidos dos referenciais mais básicos e têm por alimento da alma apenas a esperança depositada em dias melhores.Felizes ou apenas esperançosos têm, como todos nós, carências, problemas, alegrias, vontades, medos, posturas e os mais heterogêneos sonhos. Some-se a isso o fato de estarem atravessando uma fase de formação, de intenso aprendizado, de dúvidas, de questionamentos, de buscas incansáveis... Têm o privilégio, e também a grande responsabilidade, de ter todo um futuro pela frente. Nesse sentido, nossas políticas públicas educacionais levam em consideração, em primeiro lugar, as necessidades mais básicas desses cidadãos do futuro: a compreensão, o respeito por suas diferenças, por seus valores e pela história pessoal de cada um.O desempenho, o sucesso e a ampliação do potencial dos aprendizes dependem de nossa sensibilidade para vê-los como seres humanos e não apenas como números registrados nas listas de chamada. Por meio dessa prática, nós, educadores, poderemos ter a chance de ir além e de também aprender com nossos educandos. Sem essa troca essencial, estamos condenados a perder o brilho, a seiva, o norte... Educar é, sobretudo, nunca deixar de aprender e de acreditar. O primeiro passo para fazer da educação uma possibilidade real para todos já foi dado na medida em que promovemos a universalização do ensino. Os números mais recentes apontam um total de 99% de crianças freqüentando a escola no Estado de São Paulo. Uma vez garantido o acesso aos bancos escolares, nossos esforços convergem diretamente para as melhorias nas condições de aprendizagem - decorrentes do reflexo direto da mudança de filosofia da cultura escolar. Agora, singramos os mares de forma mais habilidosa porque navegamos com um lema comum a todas as nossas rotas: "todo professor é capaz de ensinar, todo aluno é capaz de aprender". E o inverso é absolutamente verdadeiro. Um lema que nos faz respeitar, por exemplo, o ritmo próprio de aprendizado e de assimilação de conteúdos de cada estudante. Um direito do indivíduo que vinha sendo relegado, mas que ganhou força com a implantação, em janeiro de 98, do regime de progressão continuada da aprendizagem, que possibilita o avanço contínuo dos alunos ao longo do percurso escolar, organizando o Ensino Fundamental em dois ciclos de quatro anos cada. Para ampliar os benefícios dessa prática aos estudantes de níveis mais avançados, adotamos a flexibilização do currículo no ensino médio, permitindo a matrícula por disciplina e evitando que o aluno refaça componentes nos quais foi bem-sucedido. Nessa viagem de importância histórica, a sociedade civil organizada tem sido nossa grande companheira. Empresas, igrejas, ONGs, universidades, entidades e associações variadas têm contribuído para que nossos alunos e professores desfrutem uma formação intelectual, física e emocional sólida, com direito ao esporte, à cultura, ao lazer, à arte, à profissionalização, à saúde e, enfim, à conquista de uma vida melhor.Juntos, temos viabilizado a capacitação constante dos educadores por meio de cursos, palestras, teleconferências e congressos. Em dezembro, por exemplo, presenciamos a formatura de 7 mil professores pelo programa PEC - Formação Universitária , programa de educação continuada, cujo objetivo é fornecer aos professores efetivos no ensino da 1ª à 4ª série, com formação de nível médio, de mais de 2 mil escolas de ensino fundamental do Estado, a oportunidade de formação em nível superior fornecida pela USP, Unesp e PUC-SP. Em todas as capacitações, encontros, visitas às escolas e conversas com os representantes da categoria, sempre ressaltamos a importância da aliança entre o aperfeiçoamento técnico do professor e a solidificação de uma postura afetiva em sala de aula. Queremos que nossos aprendizes enxerguem no mestre um exemplo a ser seguido, um amigo com quem possam contar e não uma autoridade acima do bem e do mal. Nas escolas, muitos programas e projetos têm favorecido essa prática mais afetiva e integrada. Os alunos sentem-se incentivados a participar, a descobrir e a mostrar seus talentos. Por isso, é fundamental que a comunidade do entorno escolar e da sociedade como um todo prestigie os eventos constantemente promovidos pelos estabelecimentos de ensino. Foi o que a secretaria - juntamente com a população que transitava pelo Centro de São Paulo - fez durante o mês de dezembro de 2002. Nossos funcionários uniam-se aos populares, sempre ao meio-dia, na Praça da República, para prestigiar os corais natalinos de dezenas de escolas estaduais provenientes das mais diversas regiões do Estado. O programa dos corais nas escolas, bem como aqueles ligados à música clássica, ao teatro, ao cinema, à criação de bandas e fanfarras, à preservação do meio ambiente, ao exercício dos direitos e deveres do cidadão - fortalecimento e reativação dos grêmios, campanhas comunitárias, combate às drogas e à violência, etc. - têm propiciado uma revolução verdadeiramente positiva na vida dos estudantes. Programas como Parceiros do Futuro, Comunidade Presente, Prevenção Também se Ensina, Escola em Parceria, Mutirão da Cidadania e Programa Profissão estão, na verdade, plantando sementes e oferecendo não só para São Paulo, mas para todo o Brasil, a chance de ter, num futuro breve, uma colheita digna dos anseios e do trabalho de todo o seu povo.Que as nossas palavras, corroboradas - e impregnadas - pela verdade impressa em nossas ações, possam colaborar para a discussão, para o debate e para a reflexão em torno dessa educação afetiva e eficaz. Uma educação que privilegia a criação de gerações mais capacitadas, tanto para contribuir para o desenvolvimento e o progresso da ciência quanto para desfrutar todos os seus benefícios. Uma educação que oriente e funcione como a bússola que desvenda as infinitas maneiras de navegar, com sucesso, pelos mares da vida.

Gabriel Chalita , professor, é secretário de Estado da Educação de São Paulo. Doutor em Direito, Comunicação e Semiótica, e autor de 34 livros.

Publicado na revista FAPESP, Edição 85, março 2003.