17:51

As diferenças que compõem um grupo

O QUE É UM GRUPO

Segundo Pichon-Rivière, pode-se falar em grupo quando um conjunto de pessoas movido por necessidades semelhantes se reúne em torno de uma tarefa específica.
No cumprimento do desenvolvimento das tarefas deixam de ser um amontoado de indivíduos para cada um assumir-se como participante de um grupo com um objetivo mútuo.
Isso significa, também, que cada participante exercitou sua fala, sua opinião, seu silêncio, defendendo seus pontos de vista. Portanto, descobrindo que, mesmo tendo um objetivo mútuo, cada participante é diferente. Tem sua identidade.
Nesse exercício de diferenciação – construindo sua identidade – cada indivíduo vai introjetando o outro dentro de si. Isso significa que cada pessoa, quando longe da presença do outro, pode “chamá-lo” em pensamento, a cada um deles e a todos em conjunto. Esse fato assinala o início da construção do grupo enquanto comportamento de indivíduos diferenciados.
Cada participante constrói na parceria com o outro, seu jeito de viver no grupo.
São cinco os papéis, segunda minha leitura da obra de Pichon-Rivière, que se constituem em qualquer grupo, seja de crianças, adolescentes ou adultos: Líder de mudança, Líder de resistência, Bode expiatório, Representante do silêncio, Porta-voz.
O Líder da mudança é aquele que se encarrega de levar adiante as tarefas, enfrentando conflitos, buscando soluções, arriscando-se sempre diante do novo. O contrário dele é o líder da resistência. Este, sempre puxa o grupo para trás, freia avanço; depois de uma intensa discussão ele coloca uma pergunta que remete o grupo ao início do que foi discutido.
Contudo, o líder de mudança e o líder de resistência não podem existir um sem o outro. Os dois são necessários para o equilíbrio do grupo, segundo a visão de uma relação democrática, pois na relação autoritária e na espontaneísta os encaminhamentos poderão ser outros. Para cada maior acelerada do líder de mudança, maior freio, do líder de resistência. Isso porque, muitas vezes o líder de mudança radicaliza suas percepções, encaminhamentos na direção dos ideais do grupo, descuidando do princípio da realidade. Nesse momento o líder da resistência traz para o grupo uma excessiva crítica (princípio de realidade exacerbado), provocando uma des-idealização (desilusionamento), produzindo assim um contrapeso às propostas do outro.
O bode expiatório é quem assume as culpas do grupo. Serve de depositário desses conteúdos. Livrando o grupo do que lhe provoca mal-estar, medo, ansiedade etc.
Os silenciosos são aqueles que assumem as dificuldades dos demais para estabelecer comunicação, fazendo com que o resto do grupo se sinta obrigado a falar. Num grupo falante, se “queima” quem menos pode sobreviver ao silêncio. Aqueles que calam, representam essa parte nossa que desejaria calar, mas não pode.
O porta-voz é quem se responsabiliza por ser a “chaminé” por onde emergem as ansiedades do grupo. Através da sensibilidade apurada do porta-voz, ele consegue expressar, verbalizar, dar forma aos sentimentos, conflitos que, muitas vezes, estão latentes no discurso do grupo.
Grupo é essa trama, na qual jogamos com papéis precisos, às vezes, estereotipados, outras, inabaláveis. Grupo não é, pois, um amontoado de indivíduos, é mais complexo do que isso.
Grupo é o resultado da dialética entre a história do grupo (movimento horizontal) e a história dos indivíduos com seus mundos internos, suas projeções e transferências (movimento vertical), no suceder da história da sociedade em que estão inseridos.
Grupo é:
A cada encontro: imprevisível
A cada interrupção da rotina: algo inusitado.
A cada elemento novo: surpresas.
A cada elemento já parecidamente conhecido: aspectos desconhecidos.
A cada encontro: um novo desafio, mesmo que supostamente já vivido.
A cada tempo: novo parto novo, compromisso fazendo história.
A cada conflito: rompimento do estabelecido para a construção da mudança.
A cada emoção: faceta insuspeitável.
A cada encontro: descobrimento de terras ainda não desbravadas.

(FREIRE, Madalena. O que é um grupo. In: Educador. Paz e Terra, 2008)

20:00

Maneira prática de lidar com a indisciplina escolar

INDISCIPLINA NA ESCOLA E NA SALA DE AULA

O “avental” que protege o professor

Todos os professores de uma escola deveriam se reunir com os coordenadores e diretores para estabelecerem entre si um padrão para cada tipo de transgressão que os alunos cometem. Assim, poderiam levantar um inventário das indisciplinas mais comuns dos alunos, avaliá-las e estudar quais as conseqüências educativas progressivas a serem adotadas pelos professores. Esse padrão será o “avental” comportamental que protegerá as idéias e a pele do professor das transgressões dos alunos.
Para chegarem a esse “avental”, todos os professores deveriam participar de sua “confecção”. Mesmo que um professor não concorde com o “avental” votado e aprovado pela equipe, terá de vesti-lo. Se recusar-se, estará dando aos alunos um exemplo de desobediência, e estes se sentirão autorizados a também infringir outras normas escolares.
Há uma grande diferença entre o “avental” que representa a função escolar, a roupa e a pele do professor. Se o aluno transgride, agride ou atira um objeto contra o professor na sala de aula, o primeiro a ser atingido é o avental, portanto, a escola. Assim como o professor é resguardado pelo avental, precisa também defender a escola da qual faz parte. Defendendo a escola, ele estará se protegendo.


O “avental” protege a escola.
A roupa resguarda a função do professor.
A pele protege a integridade física do professor.


Caso o professor não use o “avental”, as transgressões dos alunos atingirão sua roupa. O professor estará sendo atingido na sua função em sala de aula, que deveria ser respeitada por todos, inclusive por ele mesmo, pois esta função está predeterminada e bem definida antes mesmo de começar a aula. Quando o professor se sente atingido na sua pessoa física, nas suas convicções pessoais ou nos seus sentimentos é porque a agressão atingiu o alvo visado. Sua reação torna-se tremendamente pessoal. Isso é muito sério, pois a transgressão do aluno atravessou o “avental” escolar e a roupa para atingir a pele do professor.
Assim como há professores de pele (casca) grossa, a quem nada atinge, há também outros cuja sensibilidade fica exposta, mesmo sob a proteção do “avental”. Está claro que os professores não poderão virar robôs com aventais de ferro, como as armaduras dos cavaleiros medievais, que tiram inclusive a sua liberdade de expressão e criatividade. Porém, a escola não deve distribuir aventais rotos e esburacados, que não protegem seus representantes.

O “avental” comportamental dos professores gera
tranqüilidade nos alunos e confiabilidade nos pais.


O uso do avental

A escola que confeccionar o seu avental comportamental terá uma organização própria caracterizada pela integração das opiniões e aprovações de todos os professores. No “avental” estará presente a contribuição de cada professor, portanto, não lhe será estranho o uso.
O uso do avental faz com que todos sejam organizados, disciplinados e progressivos, fator essencial à formação da cidadania.

Pessoas civilizadas são disciplinadas.


Escola, mais que família, menos que sociedade

Uma das funções da escola é: ao enxergar a indisciplina, servir de espaço intermediário entre família e sociedade. É um contexto no qual as regras e exigências são mais severas que as da família, porém mais brandas que a sociedade. Portanto, a escola não deveria deixar passar impune o que na sociedade não poderá acontecer.


A família pode tolerar,
E a escola não deixar passar
A indisciplina que a sociedade irá punir.



TIBA, Içami. Ensinar aprendendo: novos paradigmas na educação. São Paulo: Integrare Editora, 006.

19:09

COMPROMISSO QUE DINHEIRO NENHUM PODE COMPRAR

E-mail publicado pelo Jornal de Hoje em dezembro de 2008. Em destaque as doces palavras do colunista


Adivinhe quem vem para o café-da-manhã: Cyntia Menezes
Cyntia Maria dos Santos Menezes é uma das boas surpresas que uma coluna diária ainda proporciona – muito além do baixo salário, do esforço constante, da pedra que cada Sísifo deve transportar, montanha abaixo, montanha acima (condições comuns a inúmeras categorias profissionais, incluindo professores, jornalistas e empregadas domésticas, pra citar algumas).A professora Cyntia Menezes é uma daquelas leitoras que, apenas com a sua percepção, conseguem melhorar o que aqui se publica – e seu email é uma daquelas muitas coisas que mastercard, visa, americanexpress e que tais nenhuns podem se arvorar de comprar. Ainda mais necessário quando “o STF manteve o valor de R$ 950, mas, ao modificar os critérios para se calcular este valor, mudou totalmente o conceito de Piso” – como explica o deputado Mineiro em seu sítio na net (pra entender melhor confiram em www.mineiropt.com.br).É por isso mesmo que segue abaixo, café-da-manhã vitaminado de esperanças, também estas muito além das árvores enfeitadas desta época do ano.


COMPROMISSO QUE DINHEIRO NENHUM PODE COMPRAR

Olá, meu caro Ivo! Com dez mil coisas para fazer e sem tempo ao menos para piscar, cá estou em frente ao computador para “escrevinhar-lhe” duas dúzias de palavras. Teria feito ontem mesmo se o dia tivesse durado pelo menos trinta horas. Como não foi possível fazê-lo cabe aqui aquele velho dito popular: “antes tarde do que nunca”. Seu artigo de quarta-feira passada, 17 de dezembro, me tocou bastante. Primeiro pelo fato de saber, enquanto educadora, que temos alguém como você como porta-voz (se é que me permite dar-lhe essa designação), que percebe o grande dilema que essa maravilhosa profissão – para mim um modo de vida – enfrenta nesse país.A segunda razão que me motivou escrever-lhe tem haver com um questionamento que você levantou em seu artigo, que era mais ou menos assim: “será que você, leitor, confiaria a educação de seu filho a alguém que ganha menos de mil reais?” Não foi mais ou menos isso?Hoje, devido à minha especialização em Educação Especial e Inclusiva, ganho pouco mais de mil reais – com os descontos mensais o valor diminui naturalmente para menos do que isso. Vergonhoso? Com certeza! Se merecia ganhar mais? Absolutamente! Se gostaria de ganhar mais? Definitivamente que sim! Porém meu compromisso com a educação independe de quanto ganho.Você, e qualquer outra pessoa, pode sim confiar a educação de seu filho à profissional que sou, uma vez que atuo na rede pública tal qual atuava na rede privada, e talvez até com mais afinco ao perceber a extrema carência de estímulos que as crianças da região onde trabalho possuem.O que quero poder dizer-lhe, e espero que entenda, é um dos pontos que mais tenho discutido com meus colegas de profissão. O descaso de muitos educadores que atuam na rede pública de ensino tem como escusa principal o baixo salário, porém, nada me garante que um aumento, por mais significativo que seja, traga consigo o compromisso que estes devem ter com a sua profissão. Não me garante que estes usarão uma parcela mínima de seu salário para comprar livros a fim de manterem-se continuamente a par de assuntos relacionados com a educação.Pedindo licença à rede de cartões Mastercard, eu lhe digo que “existem coisas que não têm preço” – pra todas as outras existe... você já sabe o quê. Não me entenda mal. Este e-mail não é um modo de rebater o que você escreveu: é simplesmente para poder dizer-lhe que não tenho certeza se as linhas redigidas em seus artigos devem ser gastas por quem não tem merecido defesa. As maiores vítimas nessa história sórdida têm sido as crianças, que chegam ao quinto ano de escolaridade sem saber ao menos ler palavras formadas por sílabas simples. E tudo isso porque os educadores sentem-se revoltados por ganharem menos do que merecem.Não! Não posso aceitar esse modo de pensar. Passar a juventude aos pés do senhor José de Alencar me fez ter uma visão um tanto romântica desta vida. Porém é preciso entender “romântica” nesse caso como sinônimo de quem acredita que as situações adversas podem mudar quando nos empenhamos individualmente para que isso aconteça. Tomei para mim as palavras que você redigiu e por estas, quero dizer-lhe muito obrigada! [Cyntia Menezes]
PROSA“Como é possível que, sendo as criancinhas tão inteligentes, a maioria das pessoas sejam tão tolas? A educação deve ter algo a ver com isso!”Alexandre Dumas FilhoO espírito de Alexandre...VERSO“No Sertão a pedra não sabe lecionar,e se lecionasse não ensinaria nada”João Cabral de Melo Neto“A educação pela pedra”